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19 de novembro de 2013

Postado por Unknown | Marcadores: , ,
Assombro (2005) é uma obra literária de Chuck Palahniuk, escritor nascido na década de sessenta em Pasco, Washington. Seu livro mais conhecido é Clube da Luta, que deu origem ao filme homônimo.
Seus estilo literário é recheado de sarcasmo e ironia, e tem como norma uma contemporaneidade característica, sempre levando as histórias ao absurdo que soa plenamente provável...
Não há como descrever muita coisa do livro, só que o escatológico faz parte dele, e que Palahniuk é um dos melhores autores atuais. 
Um fato interessante que pode demonstrar o impacto do livro: pelo menos setenta pessoas desmaiaram durante as leituras públicas de um dos textos que compõem Assombro. O tal conto chama-se Vísceras (ou Tripas). O li no blog Creepypasta Brasil e não tardei a procurar mais algum conto solto de Palahniuk para cá postar. Leia, abaixo, Colocação de Produtos.



Um conto por Cozinheiro Assassino
Ao Senhor Kenneth MacArthur
Gerente da Corporate Communications Kutting-Blok Knife Products, Inc.


Prezado Senhor MacArthut,
Só para esclarecer, vocês fabricam uma faca maravilhosa. Uma faca excelente.
O trabalho numa cozinha profissional já é duro, por si só, para ainda ser feito com facas ruins. Um Allumette de batata perfeito precisa ser mais fino que um lápis. Um corte de cheveu perfeito tem mais ou menos a grossura de um arame, ou seja, metade da grossura de uma batata frita. A gente ganha a vida cortando cenouras à brunoisette com as caçarolas sauté já a espera com manteiga quente, e ouvindo berros que pedem batata à minunette. Quem passa por isso logo aprende a diferença entre uma faca ruim e uma Kutting-Blok.
Eu tenho muitas histórias para contar a vocês. As suas facas vivem salvando o meu rabo.Só quem passa oito horas cortando endívias belgas pode entender o tipo de vida que levo.
Mas é infalível: você passa o dia inteiro esculpindo cenouras pequenas, dando uma forma perfeitamente ovalada a cada uma delas, e a única cenoura que sai malfeita vai parar no prato de um cozinheiro fracassado. Ele é um João-ninguém com diploma de serviços de hospitalidade, um mero pedaço de papel obtido em uma faculdade vagabunda, e agora acha que é um critico gastronômico. É um babaca que mal sabe mastigar e engolir, mas no jornal da semana seguinte ele escreve que o cozinheiro do Chez Restaurant esculpe as cenouras com desleixo.
Uma puta que nenhum banqueiro contrataria, nem para canelar cogumelos, publica na imprensa que minhas pastinacas bâtonnet são grossas demais.
São traíras. Sempre é mais fácil achar defeito no trabalho dos outros que cozinhar as refeições.
Saibam do seguinte: sempre que uma pessoa pede batatas dauphinoise ou carpaccio de carne, alguém da nossa cozinha diz uma pequena oração de graças pelas facas Kuttin-Blok. Seu equilíbrio perfeito. Seu cabo rebitado.
Claro, podem bater na madeira: todos nós gostaríamos de ganhar mais dinheiro com menos trabalho.Mas trair os outros, virar critico, fingir que sabe tudo, dar rasteiras em pessoas que tentam ganhar a vida tirando pele de língua de vitela, aparando gorduras de rins, e arrancando membranas de fígados… enquanto os críticos ficam sentados em seus escritórios limpos, digitando reclamações com belos dedos limpos… isso simplesmente não é direito.
Claro, é só a opinião dele.Mas aparece junto das noticias verdadeiras, como fome, assassinatos em série e terremotos, recebendo o mesmo grau de importância. É alguém reclamando porque a massa que pediu não estava bem al dente. Como se sua opinião fosse um ato de Deus.
Uma garantia negativa. O contrario de um anuncio.
Na minha opinião, quem sabe faz. Quem não sabe, critica.
Isso não é jornalismo. Não tem objetividade. Não é reportagem, é julgamento.
Esses críticos não conseguiriam preparar uma boa refeição nem que suas vidas dependessem disso.
Foi com isso em mente que comecei meu projeto.
Por melhor que você seja, trabalhar numa cozinha é uma morte lenta, ocasionada por um milhão de cortes de faca, dez mil pequenas queimaduras e escaldamentos. Você passa a noite em pé no cimento. Vive andando em cima de chãos gordurosos ou molhados. Sofre lesões no túnel cárpico, danos nervosos resultantes de tanto mexer, cortar e tirar com a colher. Ou de pescar um mar de camarões debaixo do gelo. Tem dores no joelho e veias varicosas, afecções do pulso e do cotovelo por esforço repetitivo. Uma carreira coroada de calamares rellenos equivalentes ao martírio de uma vida toda. Uma vida toda produzindo o ossobuco allá milase ideal, equivalente a uma morte lenta por tortura.
Por mais que seu couro seja grosso, porém, não é bom ser retalhado em publico, por alguém que escreve num jornal, ou na Internet.
Esses críticos virtuais estão por ai às dúzias, basta ter uma boca e um computador.
É isso que todos os meus alvos tem em comum. Por sorte os policias não cooperam muito uns com os outros. Talvez notassem um escritor independente em Seatle, um estudante resenhista em Miame, um turista do meio-oeste postando sua opinião numa página de Internet sobre viagens… Todos os meus dezesseis alvos até agora tinham algo em comum. E eu tenho anos de motivação.
Na há diferença entre desossar um coelho e desossar um babaca que escreveu na Internet que a sua constatine al finochcio precisa de mais marsala.
Tudo graças as facas Kutting-Blok. As facas para tourné, forjadas, executam as duas tarefas com perfeição, sem cansar a mão e o pulso como fazem as facas de desossar prensadas, mais baratas.
É como limpar uma aba de carne ou esfolar um pilantra safado que publicou um artigo dizendo que você estragou o filé à Wellington colocando patê de fígado em demasia: As duas facas são rápidas e não requerem esforço, graças à flexível lamina de 20 centímetros da faca de cortar filé de vocês.
Fáceis de limpar e fáceis de amolar. As facas de vocês são uma benção.
Já os alvos, esses acabam me decepcionado, por menor que seja minha expectativa de encontrar essas pessoas.
Só é necessário um simples elogio para marcar um encontro, sugerindo o tipo de parceiro sexual que essa pessoa pode vir a querer. Melhor ainda, você pode sugerir que é editor de uma revista nacional, pensando em dar-lhes visibilidade mundial. Exaltar-lhes a voz. Oferecer-lhes a glória tão merecida. Abrir-lhes a porta da proeminência.
Basta acenar com metade dessa bosta lisonjeira, e esse pessoal irá ao seu encontro em qualquer beco escuro que você indicar.
Pessoalmente, os olhos dessa gente são bastante pequenos. Cada olho parece uma bola de gude negra enfiada no umbigo de um homem gordo. Graças, em parte, as facas Kuting-Blok, o aspecto do pessoal sempre fica melhor quando você limpa,apara e enfeita tudo. É carne, pronta para ser bem usada.
Depois de retiras as viceras frias de cem galinhas-de-angola, não é muito difícil cortar a barriga de um jornalista freelancer que escreveu em algum guia de entretenimento regional que seus folheados de chicória e queijo feta estavam duros demais. Não. Com seus vinte centímetros a faca Kutting-Blok torna essa tarefa tão fácil como limpar um salmão, uma truta ou qualquer peixe redondo.
É esquisito como certas coisas chamam mais a minha atenção. Olhando para o fino tornozelo branco de alguém, eu logo imagino que tipo de garota ela deve ter sido na escola, antes de aprender a ganhar a vida atacando comida. Lembro também de um crítico que usava sapatos marrons, tão reluzentes quanto a cobertura de caramelo de umcreme brûlée.
É essa a atenção aos detalhes que vocês põe em cada faca.
Eu costumava por o mesmo cuidado e a mesma atenção no meu trabalho de cozinheiro.
Por mais cuidadoso que eu seja, porém, a policia acabará me pegando. É apenas uma questão de tempo. Pensando nisso, meu único medo é que as facas Kutting-Blok fiquem ligadas, na opinião pública, a uma série de atos que podem ser mal interpretados.
Gente demais enxergará em minha preferência uma espécie de endosso. Como se Jack, o estripador estivesse fazendo um comercial de televisão. Ou Ted Bundy anunciasse uma certa marca de corda.
É realmente um tipo de endosso negativo. Talvez isso até reduza a fatia de mercado e as vendas totais de vocês. Principalmente no varejo, durante a temporada natalina que se avizinha.
Assim que recebem a noticia de um grande desastre com um jato comercial, seja um choque em pleno no ar, um seqüestro, ou uma colisão na pista, os principais jornais sempre suspendem todos os grandes anúncios de companhias aéreas programados para o dia seguinte. Isso acontece celando os anúncios, mesmo que precisem pagar integralmente pelos espaços que não usaram Esses espaços são preenchidos na ultima hora por anúncios gratuitos promovendo a Sociedade Americana do Câncer, ou de Distrofia Muscular. Pois as companhias aéreas não querem se arriscar a ficar associadas com as noticias desastrosas do dia. Não querem ficar ligadas, na opinião publica, há centenas de mortos.
É preciso muito pouco esforço para recordar o que hoje chamamos de assassinatos do Tylenol fizeram ao estoque do remédio. Com sete pessoas mortas, só o recolhimento do produto no ano de 1982 custou à Johnson & Johnson 125 milhões de dólares.
Esse tipo de endosso negativo é o contrário de uma anúncio, é isso que os críticos fazem com suas resenhas venenosas, publicadas apenas para mostrar que se tornaram inteligentes e amargos.
Os detalhes de cada alvo, inclusive as facas usadas, ainda estão todos frescos na minha mente. A policia precisaria de muito pouco esforço para e fazer confessar, anunciando publicamente a ampla variedade das excelentes facas fabricadas por vocês e utilizadas por mim, e com que propósito.
Deste momento em diante,. As pessoas sempre se referirão as “Séries de Assassinatos Kutting-Blok” ou “Matança das Facas Kutting-Blok”. A empresa de você é muito mais conhecida que um pobre anônimo como eu. Vocês já tem uma faca em tantas cozinhas. Seria uma pena ver um nível de excelência do trabalho duro de você, fruto de gerações inteiras, sendo aniquilados pelos meus projetos.
Por favor, considerem que os críticos gastronômicos não compram muitas facas. Podem bater na madeira, mas todo o nosso ramo talvez fique do meu lado nesse caso. Eu, um herói popular. Nunca se sabe.
Qualquer pequeno investimento que vocês possam fazer trará benefícios à ambas partes.
Quanto mais recursos vocês puderem fornecer para que eu não seja capturado, menos provável será que esse fato infeliz venha a ser conhecido pelos fornecedores de facas. Um pequeno brinde de 5 milhões de dólares permitirá que eu imigre e viva sem ser notado em outro país, bem longe do mercado demográfico de vocês. Para a empresa esse dinheiro garantirá uma ascensão constante e um futuro grandioso. Para mim, financiará a reciclagem em outra área de trabalho em uma carreira nova.
Ou então, por apenas 1 milhão de dólares, eu passarei para as facas Sta-Sharp…e se for preso, jurarei que usei o produto de segunda categoria durante todo meu projeto…
Um milhão de dólares, que tal isso em troca de fidelidade à marca?
Para demonstrar que desejam contribuir com meu plano, por favor publiquem um anúncio no jornal local  de vocês no próximo domingo. Ao ver o anuncio, eu entrarei em contato para aceitar sua ajuda. Até então, preciso continuar meu trabalho. Caso contrário, vocês podem esperar outro alvo.
Obrigado por levar em consideração minha solicitação. Aguardo uma resposta de vocês em breve.
Neste mundo em que tão pouca gente dedica sua vida à produzir produtos de qualidade duradoura, envio meus aplausos à empresa.

Como sempre, continuo sendo o maior fã de vocês,
Richard Talbott

3 comentários:

  1. Acho impressionante a interpretaçao humana à cada categoria e funçao de cada objeto ou corpo demonstra cada pensamento de desejo de realiçao de um ato , admiro seus bons olhos para escolher este texto.

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    1. Minha praia é mais Poe, admito sinceramente e com alguma vergonha que selecionei o texto mais pela fama do autor, mas também me surpreendi com a qualidade do mesmo e a mensagem empregada.
      Muito obrigado pelo incentivo, Kloss.

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  2. Acho impressionante a interpretaçao humana à cada categoria e funçao de cada objeto ou corpo demonstra cada pensamento de desejo de realiçao de um ato , admiro seus bons olhos para escolher este texto.

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Escreva, monstrinho.